Ilha da fantasia: conheça a Sicília

Com paisagens surreais e uma atmosfera única, o destino volta ao radar do mundo impulsionado
pelo sucesso de The White Lotus


Por HERMÉS GALVÃO

De tempos em tempos, a Sicília entra em erupção no imaginário coletivo para trazer à tona sua história e geografia tão inquietas quanto seu povo. Palco milenar de odisseias terrestres, outrora ocupada por regos e romanos, bizantinos, árabes e espanhóis, fotogênica na tela, na moda e na vida real, a ilha mais indisciplinada e generosa da Itália celebra agora sua melhor versão.

Seus hotspots deram a volta ao mundo com a segunda temporada de The White Lotus, a série que escancarou de vez as fronteiras de Taormina. Acomodada sobre o Monte Taurus, entre a serenidade do Jônico e a fúria do Etna, incomodada com as explosões de calor dos banhistas às margens da Isola Bella, a pequena cidade é parada obrigatória e ponto de partida para uma road trip pela costa oriental da maior ilha do Mediterrâneo.

A partir de suas escarpas, que levam até a costa e pelas estradas que fariam qualquer alemão desistir na primeira curva, partimos em direção a Siracusa, com seu magnífico anfiteatro grego e a Orelha de Dionísio, uma gruta de calcário onde ouve-se turistas contando casos que até Zeus duvida. Colada a ela está a ilha de Ortigia, pérola fundada em 734 a.C. pelos Coríntios e terra natal de Arquimedes – lá, matemática é simples: some-se à multidão e lute por um metro quadrado no lido mais próximo. Imperdível, mesmo para os mais incrédulos, uma visita à Cattedrale della Natività di Maria Santissima, incorporada ao que outrora foi o principal templo sagrado da então pólis de Syrakousai, dedicado a Atena/Minerva e convertido em igreja com o advento do cristianismo. Seu interior com colunas dóricas que remontam ao período siceliota faz dela única e imperdível entre centenas de
catedrais sicilianas.

Nota importante antes de seguirmos viagem: em 1693, a Sicília sofreu um terremoto que deitou abaixo grande parte de sua arquitetura original, um tutti-fruti de estilos que narravam o desejo e o bastião de reis, príncipes e sultões que um dia quiseram controlar o Velho Mundo. Todas as construções posteriores foram erguidas a partir do barroco, estilo que domina a paisagem de Noto, Modica e Ragusa, três patrimônios mundiais incrustados nas colinas com suas praças, monumentos e palácios em travertino e tufa, que refletem o tom e a luz perfeitos para passe ar nas tardes de sol pelos jardins criados na era dos Bourbons. Para saborear à sombra das tamareiras, granita de limão ou romã acompanhada de arancini com mozzarella e piselli. Na descida para a praia, dois spots fundamentais para mergulhar no doce balanço do Italia no a caminho do mar (cariocas entenderão): Spiaggia di Calamosche e Marzamemi, já no extremo da face leste da ilha, com suas terraças e trattorias onde come-se o melhor da culinária local – pense em pasta alla norma, caponata, sarde a beccafico e stigghiola.

Rumo ao norte, um imperdível giro pelo arquipélago Eólico para dias al mare em Panarea, ponto de encontro da juventude dourada milanesa, e Stromboli, a ilha com o vulcão mais ativo da Europa e um espetáculo pirotécnico único no mundo. Acima e antes de qual quer tendência, o que está em questão é a experiência de ver (e viver) sem ser tão visto. Em tempos de selfie e hashtags de autoexaltação, uns dias offline para usar as mãos na infalível comunicação analógica italiana fazem bem para o corpo e renovam o espírito.